Não acredito que consegui chegar aqui...e devo isso ao Carlos.
Ele morreu para eu e a Ana Paula chegarmos aqui...
Depois de três dias na estação,decidimos que não era muito sensato ficarmos lá,já que as saídas ficaram completamente cercadas.
Então,o Carlos encontrou uma espécie de sala de controle da estação,e ligou as luzes da plataforma.Infelizmente,as luzes dos túneis não eram controladas por lá,de modo que tivemos que seguir viagem no escuro.
Carlos só tinha uma lanterninha pequena,que iluminava no máximo uns 5 metros à nossa frente.
Foi muito deprimente passar estação por estação,vendo tudo aquilo vazio...acho que quando tudo saiu de controle,a maioria das estações estavam fechadas...provavelmente foi na hora de fechar as estações... mas na correria,não houve tempo de fecharem todas.
Entre as estações Pedro II e Sé,vimos o primeiro infectado,que surgiu das sombras e correu em nossa direção.Carlos o abateu sem dificuldades...os dois tiros disparados por ele com certeza ecoou por algumas dezenas de quilômetros...e o fato de estarmos num túnel deve ter ampliado aquilo.
Na estação da Sé,foi que toda a merda aconteceu...tudo seria fácil.Sair da linha vermelha,e passar para a azul,em direção à Jabaquara,até mudarmos de linha novamente,para a linha verde,onde iríamos andar duas estações até a Trianon-Masp .
Seria fácil,se o chão de toda a estação não estivesse cheia de corpos...centenas deles.
Enquanto caminhávamos pela estação,observei aquele tapete de corpos,o ambiente impregnado,com cheiro de morte...quase na plataforma da linha azul,vi um corpo sentado de um policial militar,com a cabeça inclinada e uma arma na mão...naquele estado de decomposição,era impossível distinguir se ele havia cometido suicídio,mas era fácil deduzir...
Talvez uma multidão de infectados tenha invadido a estação,e quando viu que era impossível conter todo mundo,o desespero tomou conta daquele policial...
-Droga...então era verdade...-Carlos rompeu o silêncio,e seu sussurro pareceu um grito -Ouvi no rádio um comunicado sobre esta estação...chamaram de "hot spot"...
Eu fiquei em silêncio,e a Ana começou a ficar nervosa,quase assustada...acho que ela já tinha ouvdo aquela expressão...
-É um ponto quente...quando essa doença explodiu,esse não era um lugar muito sensato de se visitar...-Até ele mostrava preocupação... -Provavelmente não estamos sozinhos,então,muitas dessas pessoas não estão mortas...
Assim que ele disse isso,pulamos na linha do metrô...e a Ana Paula começou a chorar.
Uma espécie de grunhido chegou aos nossos ouvidos como um tapa na cara,e sem nenhuma necessidade de aviso começamos a correr...
Tenho certeza de que passamos por umas duas estações sem diminuir o ritmo,e o barulho de pedras sendo pisadas era constante.
A lanterna acesa do Carlos balançava freneticamente enquanto ele corria,e o feixe de luz girava pelo túnel iluminando casualmente a nossa frente...
Talvez,os infectados estivessem a uns 30 metros atrás de nós,e de vez em quando,o Carlos parava e mandava uma rajada de tiros na multidão.
Corri tanto,que senti meu peito queimar,meu sangue ardia como ácido a cada batida do meu coração.
A Ana Paula ameaçou parar muitas vezes e a cada vez que acontecia isso,Carlos a pegava pelo braço e quase a arrastava.Numa das vezes ele tentou gritar,e quase saiu um sussurro.
-Pe..pelo amor de Deus...não para!
Quando ninguém mais aguentava correr,vimos as luzes de uma estação ao longe...
Aquilo foi um alívio...assim que vimos a placa azul onde estava escrito "PARAÍSO",escalamos a plataforma com tanta rapidez que poderíamos ganhar uma competição daquilo...
Procurando desesperadamente por placas de sinalização,fomos para a plataforma da linha verde que dizia "Embarque-Vila Madalena".
Assim que pulamos na linha do metrô,desabamos no chão.O cansaço e a altura de que pulamos fez com que ficássemos uns 30 segundos no chão.A respiração de cada um de nós parecia a de alguém que conseguia chegar à superfície depois de ficar debaixo d'água por mais de 5 minutos.
E depois,ouvimos barulhos de passos no chão...alguns daqueles infectados conseguiram subir a plataforma e estavam correndo pela estação...
Droga...estou exausto para escrever...tentarei terminar amanhã.
E mal posso esperar pra dormir na minha nova cama...
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